quarta-feira, 17 de novembro de 2010

Água e dez colheres de açúcar.

Querida Lucy,

Cada início para esta carta que estruturo em minha mente perturbada é deveras inadequado. Ao acordar hoje, encarei o céu por algumas calorosas vezes. Senti um certo prazer, por um momento desconhecido, ao avistar o sol que esgueirava-se por entre as nuvens, tentando dar as suas boas-vindas diárias e o "pontapé inicial" para um novo dia. O bem-estar que percorreu meu corpo foi justificado quando, esperadamente, associei àquela luz faiscante e animadora a alguém: você.
Confesso que fora surpreendente para mim fazer estranha associação entre pessoas e elementos naturais. Logo eu, que sempre retratei as pessoas como meros alicerces destruidores e, a natureza, como vítima dos racionais. Mas, Lucy, afirmar que criatura tão encantadora quanto tu, és realizadora de algum ato ruim ou feio, seria mero atraso de tempo e desperdício de raciocínio.
Contudo, minha flor, devo afirmar que tu andaste, sim, cometendo um crime impiedoso para com este que te escreves. Há de existir alguma lei que garanta meus direitos sobre meus órgãos... Sobre meu coração! Roubaste-o de mim e, agora, fazes com ele com o que bem entendes. Não é justo, não é bondoso... É de uma maldade tão cruel!
Não compreendo... Conte-me, Lucy. Fora por acaso? Ou tu planejaste cada detalhe, arquitetando planos maquiavélicos com meu coração desajeitado e enfadonho?
Porém, devo contar que, ao sequestrar tal orgão crucial de meu corpo, tu me fizeste reinventar uma das certezas mais antigas que carregava comigo: não sou feito de pedra! Meus pulmões enchem-se de ar, esvaziam-se... Meu estômago pode sentir-se enjoado sem motivos óbvios... E, óh, meu coração pode vibrar, enlouquecer, acalmar-se... Encantar-se, Lucy!
Sou invadido por uma mistura imperdoável de reações e sentimentos, que escorrem por minhas veias e contaminam meu sangue com o vírus mais sadio e benéfico. O que fizeste?
Estou um pouco perdido... Afinal, foram tuas mãos quentes e resistentes ao frio de minha alma? Foste a tua tranquilidade repleta de segundas, e terceiras, e quartas, e infinitas intenções?
Óh, Deus... Estou vulnerável a teus encantos! Não me comando, não há sinapses em meus neurônios. Seguir-te e entregar-me é automático e vital como respirar!
Sou sincero, Lucy. Tu me conheces o bastante para saber que, para ti, nunca sequer pude esconder meus ideais e mentir sobre meus afetos e desamores.
Frases assim são encontradas em livros novos e antigos, e já são tão exaustivas de se ler... Parece tão escancaradamente copiado. Mas, meu doce, mel de toda a minha existência, sabes que quando te avistei pela primeira vez, por alguns milésimos de segundo, meu cérebro sussurrou teu nome e gravou cada feição tua em um lugar especial. Há um santuário dedicado a ti em alguma porção de minha massa cinzenta!
Desculpe-me. Não terei coragem de reler esta carta, pois tenho medo de realizar alguma alteração descabida por tentar controlar o incontrolável. Porque... Eu já desisti disso.
Estou sofrendo, Lucy. Eu não queria falar assim; gostaria de transmitir, em minhas palavras, emoções boas e eloquentes. Todavia, não posso negar que sofro por tu não demonstrares tua paixão da maneira como eu sonhei, noite passada, em receber.
Lembras quando tu perguntaste, com tua típica ingenuidade de jovem mocinha, se eu estava feliz em selar meus lábios com os teus? Trilhões de respostas, de emoções, de encantos passaram voando por mim. Murmurei alguns sons inaudíveis, que infelizmente não percebeste, na tentativa de expressar meu estado agudo e intransitório de felicidade. Conhecer o teu gosto açucarado e peculiar fora como nascer para um mundo contornado de recantos imaculados. Acabei respondendo apenas o meu "sim" trágico, mofado, comum de um guri de mente velha e embolorada. Arrependi-me tanto...
Perdoa-me, meu encanto de menina? Se eu pudesse e conseguisse lhe dizer tudo que desejo, óh... Ficaríamos aqui por semanas! Gostar de ti, meu sol, é uma fonte inesgotável de inspiração.
Tu sabes que nunca amei. Sempre tive aversão a tudo que invadisse minha individualidade, que ultrapassasse os limites impostos por mim mesmo ao amor. Suspeitava que, no espaço de meu coração (agora extraviado!) estivesse alguma pedra... Um diamante, talvez! Me achava dono da verdade, da razão, da emoção, inerte a tudo aquilo que pudesse me mudar de determinada forma. Tinha medo do meu real eu, receio de não ponderar resultados, de substituir o "pensar" por "fazer".
Pois agora digo: óh, bobos aqueles que não amam! São reles marionetes do tempo e da própria insegurança. Até mesmo sofrer - e aprender, consequentemente - é mais proveitoso do que ser refém das armadilhas da estagnação.
Não me esqueça, Lucy.
Deixe-me adormecer nos seus pensamentos inconstantes, e tornar-me capaz de suportar todo o amor que, em meus sonhos, tu tens guardado para mim.


Com o mais intenso e doloroso amor,
Do céu onde tu brilhas. Do teu poeta.

Não há uma explicação muito atípica para esse singelo texto. Puro reflexo de uma amante das ilusões e do romantismo do século XVII!
Espero que as palavras transpareçam um pouquinho da doçura que tentei colocar nos ingredientes desse conto.
Aceito comentários de todos os tipos (tenho a leve impressão de que repito isso em quase todos os posts). Eu posso apostar que qualquer coisa que vocês disserem vai ser melhor do que o comentário da minha mãe sobre esse texto! haha.

Então... Desculpem-me pelo excesso de linhas!
Beijos! =*